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#21 — Fagulha de Escrita: Invasão Alienígena
Não tive tempo de escrever essa semana, então vou repostar uma fagulha de escrita para incendiar suas ideias. Mas temos mais vídeos da Vanessa continuando seus Diários de uma Autista, com um bônus dela cantando!


Imagine um planeta. Pode ser o nosso próprio planeta, mas pode ser um importante. Este planeta tem vários povos e nações que se aliam, mas também se disputam. Pertencem ao mesmo planeta, mas não são iguais. São diferentes.
Então vem os alienígenas. Eles são diferentes, chegando em naves incompreensíveis para os habitantes deste planeta. Chegam altivos no planeta, avaliando tudo, e então alguns deles tentam se comunicar com as pessoas daquele planeta. Em troca de peças de tecnologia útil para o planeta, eles pedem alguma coisa sem valor.
Os alienígenas vão embora, mas depois voltam. Estabelecem um posto de troca: damos certa quantidade desse recurso natural sem valor em troca de mais da tecnologia inicialmente incompreensível dos alienígenas.
Alienígenas vêm em vários países, alguns abrem outros postos de trocas, outros escravizam, outros matam e roubam. A constante é que, em todos os lugares, esses alienígenas vêm para buscar este recurso (ou recursos) e levar embora. Daí começam a ocupar mais e mais espaço, cultivando um novo recurso que também só é útil para ser levado para fora, para o planeta dos alienígenas (seja ele qual for).
Existem países lutando contra alienígenas, existem países se aliando a alienígenas, e existem alienígenas lutando contra outros alienígenas. Existem países se aliando a alienígenas para lutar contra outros países. Ninguém entende direito esses alienígenas, só entende que todos eles querem algo deste planeta para levar para o deles.
As personagens protagonistas da história trabalham para a construção de uma aliança deste planeta contra alienígenas. A menos que estes alienígenas aceitem uma coexistência pacífica sem roubo de recursos, eles não podem ser bem vindos. Estão se preparando para uma guerra.
Os alienígenas tem armas mais poderosas, mas não conhecem o planeta como os habitantes deles.
Conte a história de como esses alienígenas serão expulsos.
Quando ainda participava do saudoso Clube de Escrita Mafagafo, em uma das reuniões, alguém disse sobre uma diferença entre a história de alienígenas nos EUA e no Brasil. Imaginavam que os EUA, com sua política anti-imigração, tratariam forasteiros como ameaça. Já no Brasil, temos uma cultura acolhedora que ofereceria um cafézinho para o alienígena.
Esta é uma imagem interessante e pode ser aí uma outra fagulha de escrita para você. Mas agora, alguns anos depois, vou propor uma outra visão sobre isso. Por muito tempo os Estados Unidos da América se venderam como “Terra das Oportunidades”, atraindo para si o impulso para imigração. Este discurso de “Terra das Oportunidades” não é algo que parou de acontecer por parte dos EUA, o discurso continua. O estranho para nós é que este discurso que serve como propaganda vem junto com todos os discursos anti-imigração. Daí podemos nos perguntar: por quê? Que contradição é essa, ó Estados Unidos da América?
Posso deixar a resposta com Milton Friedman, o papai espiritual dos Chicago Boys, parceiro gringo do Pinochet e ídolo do Paulo Guedes. Clique para ver Milton Friedman dizendo:
Veja, por exemplo, o caso óbvio, imediato e prático da imigração mexicana ilegal. A imigração mexicana, através da fronteira, é uma coisa boa. É uma coisa boa para os imigrantes ilegais, é uma coisa boa para os Estados Unidos, é uma coisa boa para os cidadãos do país, mas só é boa enquanto for ilegal. É um paradoxo interessante para se pensar. Legalizem a imigração e já não valerá a pena. Por quê? Porque enquanto for ilegal, as pessoas que entram não têm direito a assistência social, não têm direito a seguridade, não têm direito a outras miríades de direitos que despejamos do nosso bolso esquerdo para o direito. E enquanto elas não têm direito, [considerando que] elas migram por empregos, elas aceitam empregos que a maioria dos cidadãos deste país não querem. Elas fornecem aos empregadores trabalhadores que, de outra forma, não conseguiriam. Eles são trabalhadores bons, esforçados, e estão claramente em melhor situação.
Estadunidenses não são verdadeiramente anti-imigração. Eles veem a imigração como uma forma de exploração. Imigrante lá é alguém que eles querem (desde que seja ilegal) porque serve para enriquecê-los e também serve como bode expiatório para todos os problemas internos de lá.
E brasileiros também não são tão acolhedores assim. Nem vou citar Guerra dos Emboabas, vou citar a xenofobia brasileira contra o imigrante haitiano. Podemos nos lembrar também do assassinato do imigrante congolês Moïse Kabagambe no Rio de Janeiro, ou a xenofobia contra médicos cubanos. Esta xenofobia acontece até mesmo entre regiões em decorrência das migrações internas do país, como podemos ver neste vídeo.
O mito do brasileiro acolhedor é por causa dos incentivos para imigração EUROPÉIA (especialmente alemã e italiana) na República Brasileira pós-abolição. Se é para ter trabalho assalariado, que seja para brancos, não para negros.
Então vale a pena pensar: para quem é o cafezinho que oferecemos?
Bônus: café foi um dos nossos recursos de exportação. Os alienígenas chegaram aqui e seus descendentes começaram a plantar café para vender para o país deles, operação sustentada na base do trabalho escravo.
Nosso problema é o colonialismo. E se tem algo que já aconteceu e precisa continuar acontecendo é uma aliança nativa anti-colonial. Então, sim, nós usaríamos a violência contra uma invasão colonial alienígena sim! Essa história também é nossa!
Recomendações
A Floresta é o Nome do Mundo, da Ursula K. Le Guin: A história foi pensada como uma alegoria para a Guerra do Vietnã, mas invasão colonial por invasão colonial, serve muito para se pensar uma guerra anticolonial de indígenas frente a colonizadores. Inclusive, é uma história muitíssimo superior a “Avatar” do James Cameron.
Projeto Querino: A história do Brasil sob a ótica negra. Talvez fale pouco sobre o processo inicial da colonização, mas a história do Brasil é a história de como este território foi colonizado e as consequências deste fenômeno hediondo. É também a história de luta contra este legado.
Impressões Rebeldes, da Universidade Federal Fluminense: no link que compartilhei temos uma lista completa, em linha do tempo, de todas as revoltas do Brasil. Recomendo dar uma olhada PRINCIPALMENTE nas revoltas indígenas no primeiro século de colonização para desenvolver esta igreja.
Que esta fagulha incendeie suas ideias.
Comentários
Então, essa fagulha de escrita tinha sido enviada lá na newsletter antiga do substack (abandonada às traças). Mas tinha recebido um comentário da Ana Dantas (a editora da VAL). Vou reproduzir aqui:
Eu confesso que fico meio preocupada com cenários fantásticos com paralelos muito fortes com problemas de colonialismo e racismo, porque um livro de fantasia (ou ficção científica, tanto faz) tem que acabar, e tem que acabar com uma "sensação de conclusão". Se o foco no problema maior (que é o paralelo do mundo real) for muito grande toda tentativa de "resolver" esses problemas na ficção fica meio reducionista. Quando o foco é num problema menor da vida dos personagens e o problema maior é só parte do cenário eu acho mais fácil de lidar, porque você pode mostrar o quanto isso é ruim, mencionar como chegamos nisso e até falar de coisas que as pessoas fazem para tentar resolver, mas não tem a obrigação hercúlea de colocar um ponto final nisso dentro da história.
Este é um ponto muito bom! Na época eu respondi o seguinte:
Depende do escopo utilizado. Normalmente quando você vai para uma parada mais "épica" (me fazendo valer do "elemental genre" do Writing Excuses), te dá a possibilidade de escrever sobre um evento que redefine aquele mundo.
O grosso do colonialismo, por exemplo, já foi resolvido em alguns lugares do mundo. (Ex: China). Obvio que deixa consequencias de outros problemas menores a serem resolvidos a longo prazo. Enfim, cada um dos exemplos históricos que vou citar tiveram desdobramentos diferentes, mas trouxeram algum grau de triunfo.
Revolução Haitiana
Revolução Russa (tem sim um componente anticolonial fortíssimo porque precisaram lidar com o antigo Império Russo)
Revolução de Burkina Faso, Argélia, Angola e muitas outras do processo de descolonização da África no século XX
Revolução Vietnamita
Revolução Chinesa
Enfim, há outras. O interessante é a possibilidade de ver onde teve triunfos e quais são os desafios concretos. Daí é pensar que literatura é um "ambiente semi-controlado" kkkkkk eu poderia imaginar: "e se no pós-revolução haitiana eles resolvessem o problema econômico sem recorrer a plantations?". Dá pra fazer sem ser reducionista, desde que não seja um final 100% feliz e agora é só paraíso também kkkkkkkkkk
Outra solução é o que tô vendo o John Scalzi trabalhar na saga "A Guerra do Velho", em que a próxima historia, mesmo focada em outros personagens, lida com as consequências do que aconteceu no titulo anterior. Mas cada título e bem satisfatório.
Enfim, para esta fagulha específica, tem uma "solução" básica. Vamos lidar com a primeira fase do colonialismo, que é a invasão. A solução é "simples" neste nível: expulsar os invasores e se ver com as consequências dessa invasão. Tá bem complexo no Brasil porque temos já 500 anos dessa invasão, então no estágio atual da coisa, temos que basicamente criar uma identidade nacional emancipatória. Mas imagina se no século XVI tivessem conseguido impedir europeu de fincar raízes aqui? A questão iria para outro lado (do ponto de vista indígena) e acho que é isso que essa fagulha permite explorar.
Bom, eu diria para o Ícaro do passado que é meio forçado dizer que o grosso do colonialismo foi mesmo resolvido na China, ali acho que garoteei demais. PORÉM, mantenho ainda a posição de que é possível dar uma sensação de conclusão para um livro sem que isso seja uma solução final para todos os problemas. Além disso, uma leitura divertida também pode ser um convite à reflexão. Nem tudo precisa acabar com “e foram felizes para sempre”, né?
O mesmo serve para essa newsletter. Dá pra gente continuar conversando. Aqui no beehiiv também é possível fazer comentários e, se preferirem, também podem responder o email. Me contem aí: o que vocês acham da ideia de trabalhar com invasão alienígena?

Meus estudos. Pois é, o motivo da falta de tempo (além do trabalho) é porque estou estudando pra caramba. Não dá pra simplesmente meter o resumex de tudo aqui, mas vou mostrar o gráfico de notas atualizado.

Cada bolinha acesa é uma nota, cada bolinha apagada é uma nota em potencial. Quanto maior a bolinha, mais notas relacionadas. E, pelo esquema de cores, agora dá pra saber o assunto. E é: estou estudando muito psicologia (o que é ótimo para um psicólogo)
Diários de uma Autista. A newsletter/vlog da minha esposa continua e eu continuo na minha missão pessoal de divulgar. Então segue os vídeos:
E nisso também vou divulgar o vídeo que ela gravou cantando, porque Vanessa canta bem pra caramba!
E por hoje vamos ficar com isso. Até semana que vem!
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